sexta-feira, 6 de junho de 2014

Tremeluz

Apaixonei-me nessa manhã.
Não que fosse o amor final,
o desfecho de minha vida.
Mesmo pois esse derradeiro,
bem conheço-me,
não existirá.
O que me fez cair de amores
hoje
foi a gentileza.

A chuva que me pegou - veja só
- de surpresa
foi a mesma que acendeu no peito de bela moça,
trajada em terno e ternura,
uma vela de cortesia.

Como quem se recorda do que lhe passou
há poucos instantes despercebido,
ela parou sob a água, de guarda-chuvas aberto
e coração também,
virou-se a mim e ofereceu:
vai pegar o ônibus? Vem comigo.

Sorri.

Balbuciei um aceite qualquer,
gratidão ainda bêbada de espanto.
Tomei-lhe a sombrinha em mãos
e caminhamos como casal contente
até a catraca da condução,
onde cessou-se nosso brevíssimo caso.

Ela, moça bela,
já dormia no desconforto da janela.
Mal sabia que, tal qual a chuva,
inundou-me de alegria
a sua atenção.
E que sua vela
agora tremeluzia
no meu coração.

Contudo, com tudo
isso,
a vida, conquanto,
ela segue.
Eu desço
e a moça
dorme.

2 comentários:

  1. A vida, conquanto, ela segue... Ótimas palavras escritas sobre uma breve, mas bela, experiência. Parabéns e felicidades.

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